revista puc minas

Saúde Dependência química em pauta

foto-1

Pesquisa em Betim mapeia perfil de usuários de álcool e outras drogas atendidos no Caps-AD

Desde o final do ano passado, Eriberto (nome fictício) e seus familiares encontraram no Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas (Caps-AD), em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, o apoio necessário para que ele, que tem 33 anos, usuário de drogas há mais de 20, pudesse ter uma nova chance. Eriberto é um dos 1.195 pacientes do Caps-AD, participantes de pesquisa inédita no município, conduzida pelos cursos de Medicina e Psicologia da PUC Minas em Betim, com o objetivo de levantar o perfil do usuário de álcool e outras drogas. “Antes de chegar ao Caps -AD, onde Eriberto foi acolhido e está em tratamento, fomos a vários serviços, mas era como se ele fosse um ‘paciente de ninguém’, devido ao estigma que o dependente químico carrega”, aponta a irmã de Eriberto.

O estudo foi realizado entre abril e dezembro de 2014 e levantou dados acerca de três aspectos do paciente: perfil sociodemográfico, que compreende dados como sexo, idade, escolaridade, ocupação e moradia; perfil clínico, que inclui o diagnóstico do paciente, de acordo com o CID-10, droga e frequência de uso; e perfil terapêutico, que analisou as tentativas de tratamento e origem da demanda. No item relativo à escolaridade, 60% dos usuários atendidos no centro, ou seja, 713 pessoas têm, no máximo, ensino fundamental completo e apenas 13 deles têm curso superior. Outro dado que confirma padrões nacionais diz respeito ao sexo dos dependentes químicos. Ficou evidenciado que 79% da amostragem é formada por homens e que 80% dos dependentes químicos, ou seja, 957 pessoas, têm idade entre 19 e 48 anos.

No que diz respeito ao tipo de droga consumida ou de preferência, a pesquisa apontou um dado que é recorrente no Brasil: dos 1.195 prontuários analisados, em 82,4% o álcool aparece como principal droga. Em segundo lugar vem o crack, com 516 usuários declarados. O tabaco representa 41,6%, em seguida aparecem a cocaína, com 37,3%, e a maconha, consumida por 35,9% dos perfis analisados.

“O objetivo da pesquisa é traçar o perfil de pacientes dependentes químicos que se tratam no Caps-AD da Secretaria Municipal de Saúde de Betim. Uma pesquisa de perfil pode contribuir para um mapeamento de cidadãos mais vulneráveis ao uso de drogas em uma comunidade. A partir de informações como essas, é possível, muitas vezes, criar novas possibilidades assistenciais em um campo tão delicado e com tantos desafios”, aponta o professor Renato Diniz Silveira, coordenador da pesquisa. “Os resultados da nossa pesquisa confirmam os dados nacionais e alerta para que voltemos nossa atenção para o uso abusivo de substâncias lícitas, como o álcool. Além disso, os dados demonstram que essas questões devem ser tratadas de forma multidisciplinar e intersetorial”, reforça.

Fruto da reforma psiquiátrica

O Caps-AD é fruto da consolidação da Reforma Psiquiátrica no campo da dependência química que ganhou força, no Brasil, nas últimas décadas, e foi criado pelo Ministério da Saúde, em 2002. Em Betim, o centro existe desde 2012, já atendeu dois mil dependentes químicos e conta com equipe multidisciplinar. “As ações de combate ao uso abusivo de álcool e outras drogas devem ser intersetoriais e tratar o dependente químico como sujeito, que busca tratamento por vontade própria. Por isso, além de traçar o perfil do paciente que acessa nosso serviço, a pesquisa ajudará a definir o desenho da rede de assistência”, salienta o gerente do Caps-AD em Betim, Carlos Alberto Pereira Pinto. O apontamento é confirmado por outro dado da pesquisa que revela que 34,4% dos pacientes, ou seja, 365 pessoas chegaram ao serviço por meio de demanda espontânea ou foram trazidos por familiares, como foi o caso de Eriberto.

“O projeto terapêutico do Caps-AD leva em conta vários aspectos do perfil do usuário. Com este estudo, esperamos contribuir para dar subsídios ao campo da saúde mental em Betim, melhorando ainda mais o já excelente acolhimento que os usuários recebem no serviço”, atesta o professor Renato.

“Ainda que não tenha sido objetivo do nosso trabalho de pesquisa determinar a satisfação do paciente com o tratamento recebido pelos trabalhadores, nossos alunos muitas vezes tiveram o prazer e o ensinamento de ouvir histórias sobre funcionários e profissionais que os trataram com eficiência e respeito. Esse tipo de aprendizado não está nos livros e nem no âmbito das aulas, mas é imprescindível para a formação profissional”, acrescenta o professor.

Intercâmbio entre estudantes

Para os estudantes Allisson Vasconcelos Oliveira, 22, e Cláudio Alves Taioba Junior, 21, respectivamente dos cursos de Psicologia e Medicina, debruçar sobre um tema atual e cercado de tabus mostra que a interdisplinaridade contribui de forma positiva para ambos. “Provavelmente, depois de formados, muitos médicos e psicólogos trabalharão no mesmo ambiente e, por isso, é importante este intercâmbio entre estudantes de graduações diferentes”, aponta Cláudio. “Isso revela um aspecto essencial de nossas profissões: o cuidado com o outro”, completa Allisson. “Quando estudantes se propõem a fazer uma pesquisa contemporânea, isso os alerta para a realidade que irão encontrar ao sair da academia”, ressalta o professor Renato.

 

Radiografia da dependência

  • PERFIL DOS PACIENTES ATENDIDOS NO CAPS-AD BETIM
  • 60% têm, no máximo, ensino fundamental completo
  • 79% dos usuários são do sexo masculino
  • 80% dos dependentes químicos têm entre 19 e 48 anos
  1. *DROGAS DE USO MAIS PREVALENTE
  2. TOTAL: 1.195 PRONTUÁRIOS
  3. Álcool1.003
  4. Crack 516
  5. Tabaco 497
  6. Cocaína 446
  7. Maconha 429

Fonte: Pesquisa feita com pacientes do Caps-AD Betim, entre abril e dezembro de 2014, em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de Betim/SUS Betim

Texto
Rafaela Angeli
Foto
Marcos Figueiredo
Compartilhe
Fale Conosco
+ temas relacionados