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Construção civil Resíduos que constroem

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Estudantes pesquisam materiais de baixo custo para solucionar problemas habitacionais

Quando pequena, Gizelle Kersul Capaz não imaginou que a influência do pai ambientalista a levaria tão longe na futura vida profissional. Aluna do 8º período do Curso de Engenharia Civil da PUC Minas Poços de Caldas, ela é a vencedora da 23ª Edição do Prêmio SME (Sociedade Mineira de Engenheiros) de Ciência, Tecnologia e Inovação. Com o projeto Aproveitamento do Rejeito da Extração do Quartzito como Agregado para a Construção Civil: problema socioambiental transformado em casas populares, Gizelle viu o reconhecimento de um trabalho desenvolvido durante 12 meses. “É sempre bom pensar em algo que possa contribuir com a sociedade, o meio ambiente, o mundo em que vivemos, e é gratificante pensar que a gente desenvolveu algo para que isso aconteça”, diz.

Assim como Gizelle, outros alunos da graduação vêm desenvolvendo pesquisas para obter materiais de qualidade e de baixo custo – como um concreto resistente e leve, ou um cimento que aproveite materiais que seriam descartados no meio ambiente – para auxiliar na construção de moradias para a população de baixa renda.

A ideia de desenvolver um projeto para o aproveitamento dos rejeitos de quartzito para a construção civil partiu das constantes viagens de Gizelle a São Thomé das Letras, município mineiro conhecido como a mística cidade das pedras. A alta produção de trabalhos artesanais feitos com mineral de quartzito faz com que a cidade armazene grande quantidade de rejeitos descartáveis. Foi a partir dessas sobras que Gizelle teve a ideia de desenvolver o projeto de iniciação científica.

Como pontapé inicial, os rejeitos de quartzito são levados a Poços de Caldas depois de passar por quebra em diferentes granulometrias, gerando areia e pedra. Os tamanhos variados possibilitam os mais diferentes experimentos e resultados com a produção de telhas, tijolos, argamassa e quatro diferentes tipos de concreto para encontrar a viabilidade técnica. Segundo Gizelle, a produção de tijolos, por exemplo, teve resistência de 15,16 mpa (unidade de medida de pressão), o que representa um ótimo resultado na viabilização da pesquisa. “Por ser um projeto socioeconômico e ambiental, nosso objetivo final é a construção de uma casa com 100% de rejeito”, conta.

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Professor José Gabriel Maluf Soler e a aluna Gizelle Kersul Capaz

O orientador do projeto, professor Gabriel Maluf Soler, explica que o processo de experimento começou com a qualificação, quantificação e substituição dos materiais para chegar à análise da resistência de cada um deles e aos resultados finais. “O tijolo, pela boa resistência que apresentou, pode ser usado em construção de alvenaria armada. Se eu perco um pouco no pilar, na viga, eu ganho no tijolo. Já o concreto nos dá a possibilidade da produção de pisos. Também estamos em fase de testes para analisar a porosidade das telhas”, diz.

O projeto, que pretende viabilizar casas populares sustentáveis, também mostra que o custo da construção pode ser reduzido em até 45%. O próximo passo é encontrar fornecedores que tornem possível a construção de um protótipo de casa popular, de preferência em São Thomé das Letras, cidade que baseou toda a ideia da pesquisa. “Precisamos agora de uma última fase de viabilidade técnica. Depois disso, poderemos construir casas populares em outros lugares”, conta Gizelle.

A premiação

Para levar o primeiro lugar e R$10 mil na 23ª Edição do Prêmio SME de Ciência, Tecnologia e Inovação, Gizelle concorreu com mais 49 trabalhos técnico-científicos de alunos ligados à Engenharia, Arquitetura e Agronomia. O artigo da pesquisa foi desenvolvido de acordo com as normas e exigências da SME, como clareza na exposição do tema; criatividade e inovação; interesse técnico científico, alcance econômico, social e (ou) político; e possibilidade de execução e aplicabilidade. Analisados os critérios, o projeto de Gizelle ficou entre os 29 finalistas com pontuação média superior a 70%.

A PUC Minas ainda recebeu a premiação especial concedida à Instituição de Ensino Superior de Minas Gerais que apresentou o maior número de trabalhos classificados para a etapa final de avaliação. Para a vice-presidente da SME, Marita Arêas de Souza Tavares, a oportunidade incentiva alunos da graduação e pode determinar um diferenciado futuro profissional. “A premiação abre portas, dando maior visibilidade de competências em currículos de início de carreira daqueles que souberem tirar proveito dessa oportunidade, e, ainda, imprimindo maior autoconfiança e motivação para a participação em outros concursos ou inscrição de trabalhos em congressos, nacionais e internacionais”, diz.

Assessoria às ocupações

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Carolina Mamede, aluna do 9º período de Engenharia Civil do campus Coração Eucarístico, com o professor Ayrton Santos: em busca de soluções nas ocupações urbanas

Já os alunos de Engenharia Civil e de Arquitetura e Urbanismo do campus Coração Eucarístico, que participam do projeto de extensão Assessoria técnica às Ocupações Urbanas: Sistemas Construtivos e Ensaios Laboratoriais, que tem como objetivo principal dar assessoria técnica a entidades sem fins lucrativos e movimentos sociais vinculados às ocupações urbanas na Região Metropolitana de Belo Horizonte, desenvolvem pesquisas para analisar a viabilidade técnica do uso de materiais próprios na região das ocupações.

A partir das visitas às ocupações, a equipe elege materiais que podem ser utilizados nas construções e que, de alguma forma, deem um bom retorno à sociedade. Com a terra retirada para fazer a fundação das casas, por exemplo, os moradores podem fazer o tijolo, não sendo necessário comprar este material, diminuindo assim os resíduos. Para isso, a equipe do projeto executa ensaios laboratoriais para testar compostos, buscando qualificar esses produtos. “Trouxemos amostras do solo e fizemos as análises em laboratório. Para aumentar a liga dele, colocamos cimento, gerando um solo reforçado que denominamos de solo-cimento”, explica o coordenador do projeto, professor Ayrton Hugo de Andrade e Santos, do Departamento de Engenharia Civil e coordenador do projeto de extensão. “Outro ensaio do qual tivemos um bom retorno foi um preparado de cimento utilizando fibras de copos descartáveis, material muito encontrado nas ocupações”, explica o professor, justificando que essa seria uma forma de determinar um novo uso para um resíduo tão comum.

Antes de ir ao laboratório, os alunos vão até as ocupações conhecer as demandas dos moradores. A partir do que é apresentado, os estudantes desenvolvem pesquisas e atividades para solucionar as questões dos moradores. “Já fizemos um muro de arrimo utilizando pneus. É bacana essa troca com eles. Conheci uma realidade diferente da minha. Temos que entender as necessidades para então propor algo”, explica Carolina Mamede, aluna do 9º período de Engenharia Civil do campus Coração Eucarístico.

Além das pesquisas do solo-cimento, a equipe também está empenhada na produção de concretos leves homogêneos e concretos resistentes e coloridos. No ano passado, eles participaram dos concursos promovidos pelo Congresso Brasileiro do Concreto, em Bonito, Mato Grosso do Sul, promovido pelo Instituto Brasileiro do Concreto (Ibracon). “Nosso objetivo é fazer essas pesquisas e de alguma forma dar o retorno para a sociedade”, explica Ayrton. Para participar do Concrebol, um dos concursos realizados durante o Congresso Brasileiro do Concreto, as equipes devem criar uma esfera (bola) de concreto leve, com os materiais e as dimensões pré-estabelecidos, que seja capaz de desenvolver uma trajetória retilínea e fazer o gol.

Carolina foi uma das alunas que participaram do Congresso pela PUC Minas, em outubro do ano passado. “Neste ano, vamos trabalhar para desenvolver uma bola mais resistente do que a do ano passado”, anima-se. A próxima edição do concurso será em outubro deste ano, em Belo Horizonte.

Texto
Cloe Massa e Bruna Santos
Fotos
1Ricardo Siqueira / Argosfoto
2Lúcio Carvalho
3Marcos Figueiredo
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