Entrevista Os desafios da educação a distância
Na entrevista a seguir, o professor Marcos André Silveira Kutova, diretor da PUC
Minas Virtual há oito anos, apresenta um panorama da educação a distância no Brasil. Desde seu surgimento, a EAD enfrenta desafios, sejam eles técnicos, de aceitação ou mesmo pela falta de conhecimento a respeito. Hoje, atravessa um momento de significativo crescimento quantitativo e qualitativo. O diretor faz um resgate da trajetória do ensino a distância no país e aponta para seu futuro: com novas tecnologias, ensino híbrido e metodologias que tornam o aluno protagonista de seu aprendizado.
Qual o cenário do ensino a distância hoje no Brasil?
A educação a distância surgiu como uma alternativa de baixo custo e alta flexibilidade para os jovens brasileiros que ainda precisavam de formação. E ela cresceu muito, principalmente se comparada à educação presencial. Entretanto, não temos hoje, no Brasil, um modelo de educação a distância consolidado. Existem cursos que têm encontros presenciais, outros que não têm qualquer encontro. Cursos que se estruturam, como no nosso caso, em videoaulas, e outros que ainda se baseiam em textos. São muitas metodologias diferentes, então, não existe um modelo único de educação a distância no Brasil. Esse fato torna difícil a comparação entre instituições e, às vezes, até saber se estamos evoluindo em termos de qualidade da EAD. Mas, como a educação a distância vem crescendo continuamente, a expectativa é que sim, que ela esteja cada vez melhor.
Você diria que existe certa resistência à EAD?
No passado recente, havia muito preconceito. Hoje, não vejo mais uma fala de preconceito com a educação a distância. Podemos ver, entretanto, comentários negativos de pessoas que estão perdendo espaço por causa da educação a distância. Depois de 20 anos de educação a distância no Brasil por meio da Internet, muita gente está ganhando mercado de trabalho partindo da EAD. E mesmo aqueles que nunca estudaram de fato a distância já tiveram alguma experiência com instrucional on-line, podcasts, vídeos no YouTube, cursos de curta duração. Então, hoje é mais fácil reconhecer o valor da EAD.
O ensino híbrido é tido como o formato de ensino ideal para os próximos anos. O que você tem a dizer sobre ele?
A educação a distância vem sendo muito bem-sucedida na perspectiva de transmissão e avaliação de informação. E também na autonomia que ela oferece ao aluno para ele entender o tanto que está, ou não, aprendendo. Isso é muito interessante, porque no curso presencial, muitas vezes, você não consegue ter esse feedback contínuo sobre seu progresso. Por outro lado, a EAD tem uma característica mais individualizada e promove menos interação entre os alunos e dos alunos com o professor. Se olharmos para o ensino híbrido, podemos tirar todos esses benefícios da educação a distância na perspectiva de transmissão de conteúdo, de permitir o feedback contínuo para os alunos, de deixá-los ter certa autonomia sobre seu aprendizado, como também resgatamos todos os aspectos positivos da interação entre as pessoas.
As tecnologias estão se aprimorando e melhorando, mas e em relação à preparação pedagógica? Ainda existem barreiras?
Nesse momento, em particular, estamos vendo que os sistemas estão oferecendo novos recursos que ainda não são vistos na prática tradicional de ensino presencial como, por exemplo, a capacidade de identificar quais são as dificuldades específicas de cada aluno. Quando eu tenho uma turma de 60 alunos presenciais e tenho que gastar o meu tempo dando aula, não consigo atender individualmente cada aluno. Usando tecnologia, o sistema me sinaliza as dificuldades que cada aluno tem e se há risco de reprovação ou de abandonar o curso. Eu posso, por meio do sistema, encontrar formas de atendimento específicas para cada aluno. Por outro lado, ainda não usamos as tecnologias para avançar com os nossos modelos educacionais, que ainda são muito ligados ao tradicional. Agora que temos acesso a esses recursos e conseguimos pensar em usá-los em benefício da melhoria da qualidade da educação, podemos sugerir novas metodologias educacionais para quebrar essas barreiras.
Como as metodologias ativas?
Sim, por exemplo, como as metodologias ativas. Quando nós implantamos as disciplinas semipresenciais na Universidade, alguns professores sentiram-se perdidos, porque eles passavam grande parte do seu tempo dando aula. Só que a partir do momento em que a aula está gravada, ele tem que usar a carga horária para trabalhar com os alunos. A metodologia ativa ajuda nessa perspectiva, como forma de você trazer o aluno para participar do processo de aprendizagem, através de aulas colaborativas e discussões mediadas pelo professor.
Nestas duas décadas, o que mudou de mais substancial na EAD da PUC Minas?
Quando a PUC Minas Virtual foi criada, a educação a distância, dentro da educação superior formal e mediada pela Internet, era algo novo. Então, na primeira década da PUC Minas Virtual, nós sistematizamos todo o processo educacional. Dissemos ao professor o que ele tinha que fazer, quando e como. E avaliávamos tudo dentro de um padrão que era aplicado a todas as áreas de conhecimento. Hoje, esperamos o contrário: que o professor tenha autonomia para definir, dentro das suas disciplinas, dentro da sua área de conhecimento, como será seu trabalho, seu planejamento. Hoje, eu espero que o professor nos ajude na experimentação, na tentativa de explorar novas metodologias e novas tecnologias. Essa é a maior mudança do início da PUC Minas Virtual para cá: antes, definíamos o que era a educação a distância e dávamos orientações para o professor seguir; agora, queremos que o professor nos diga quais são os caminhos por meio da experimentação, da tentativa e erro, da inovação.