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Artigo
A pesquisa como ferramenta de desenvolvimento

Investir em ciência e inovação é oferecer perspectivas para o país

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“No Brasil os pilares da educação são frágeis, quase pilares de barro. Se há uma questão unânime no país é a necessidade de investimentos e de uma política sólida para o setor”

Ao se falar em pesquisa, remete-se à busca pelo conhecimento. Um conhecimento voltado ao desenvolvimento de uma nação. Países que tiveram em seu DNA esse critério têm hoje uma condição socioeconômica notadamente melhor que aqueles que não investiram nesse grande pilar da educação. O Brasil, embora já tenha conquistado grandes avanços na área, ainda não trata o tema como uma política de Estado – e sim de governos – e a consequência é que, diante de qualquer crise, a redução de investimentos atinge primeiramente o setor, prejudicando a geração de conhecimento. Isso vem ocorrendo ao longo dos últimos meses em órgãos de fomento no âmbito federal e mais recentemente na esfera estadual, como os cortes anunciados para este ano pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais, a Fapemig, afetando bolsas de iniciação científica e outros recursos para a pesquisa.

A história mostra que foi com a adoção de políticas focadas na busca pelo conhecimento que muitos países foram bem-sucedidos na geração de riqueza e desenvolvimento social. Um dos bons exemplos é, sem dúvida, a Coreia do Sul. Lá, o investimento em educação – e consequentemente em ciência – como uma política de Estado alçou aquele que era um dos países mais pobres do mundo, na década de 1950, a uma nação desenvolvida e um dos protagonistas no cenário econômico mundial, líder em áreas de ponta como a tecnologia da informação. Outro bom exemplo de que a geração de conhecimento é o único caminho para o desenvolvimento e uma independência maior das nações é Israel, que, para sobreviver, teve que apostar cada vez mais na educação, alcançando uma taxa de alfabetização de 97% da população e um dos melhores indicadores socioeconômicos do Oriente Médio.

Nesse contexto, vê-se claramente que no Brasil os pilares da educação são frágeis, quase pilares de barro. Se há uma questão unânime no país é a necessidade de investimentos e de uma política sólida para o setor, em que os índices de qualidade, comparados com vários outros no cenário internacional, são pífios. Exemplo espantoso disso são os dados mais recentes do Sistema de Avaliação em Educação Básica (Saeb), do Ministério da Educação, que apontou que, em 2017, uma média de 70% dos alunos daquele nível escolar têm aprendizado insuficiente em português e matemática. Enquanto países como a China fazem planejamento estratégico para o setor num horizonte de 100 anos, não temos uma clara visão do que queremos nos próximos 10, 20 ou 30 anos. E se não temos essa visão, nossa trajetória será sempre esse “voo de galinha”, para usar uma metáfora.

É nesse cenário, em que temos um modelo para a educação completamente exaurido, em que um percentual ainda pequeno da população chega à universidade e um número menor ainda faz uma pós-graduação, que se situa a pesquisa. É nesse contexto que se percebe mais claramente que, quando a educação é uma política de governo e não de Estado, os cortes de recursos em um ambiente de crise econômica atingem primeiro setores ligados à investigação científica. O caminho deveria ser exatamente o inverso: privilegiar a busca do conhecimento, pois este se propaga, trazendo benefícios para todas as áreas; identificar as áreas prioritárias e direcionar esforços para que os investimentos sejam otimizados.

É preciso destacar que muito se avançou no país em várias áreas em que se investiu em ciência e tecnologia. Foi assim com a avicultura, em que o investimento em inovações tecnológicas e o uso de um sistema eficiente de pesquisa e desenvolvimento, a partir das décadas de 1960/70, tornaram o país o segundo maior produtor mundial de frango. Outra trajetória de sucesso, resultante também de investimentos em pesquisa, trilhou o setor de energia no país, onde cerca de 45% de toda a produção energética é proveniente de recursos renováveis. Investimos em pesquisa na produção do etanol, da energia eólica, na energia solar e colhemos bons resultados. Estamos hoje nesse processo de substituição de combustíveis fósseis, mas vale lembrar que pouquíssimos países têm tecnologia para fazer prospecções de petróleo em águas profundas como o Brasil e, volto a dizer, isso é resultado de pesquisas bem direcionadas em universidades e empresas do país.

Mas se houve avanços, para mantê-los e vencer novos desafios é necessária uma política que defina a longo prazo as metas a serem atingidas. Eleger, por exemplo, as áreas em que queremos ser os players globais e investir recursos e esforços para cumprir o que foi definido. Quando se elege essas áreas, outras serão beneficiadas, fortalecendo-se, assim, a cadeia produtiva em função de uma expertise conquistada. Ampliam-se alternativas para que não haja uma dependência econômica mais fortemente ligada a setores em que não há sustentabilidade ambiental.

E quando se fala em pesquisa, em inovação, o papel da universidade é crucial. Essas instituições devem entender a sua função dentro da sociedade, no contexto regional, como indutoras e protagonistas do desenvolvimento social. Na PUC Minas, por exemplo, a investigação científica está disseminada por todas as áreas do conhecimento, indo da graduação à pós-graduação, e a parceria com a iniciativa privada tem gerado excelentes resultados, especialmente na área de tecnologia. Mais recentemente, lançamos um programa de inovação de alto impacto, o PUC Tec, que vai unir startups, que já experimentaram programas de incubação, a grandes empresas. Trata-se de um movimento para tentar acomodar toda a inovação que já vem sendo desenvolvida na Universidade há muito tempo e tentar gerar impacto em seu uso na sociedade.

No entanto, se as universidades vêm buscando alternativas para o desenvolvimento da pesquisa por meio de recursos próprios ou aliando-se à iniciativa privada, não é possível prescindir-se dos investimentos públicos na área. Em tempos de crise como a enfrentada no Brasil, investir em ciência e inovação significa valorizar um instrumento fundamental para o desenvolvimento. Mais que isso, representa oferecer uma perspectiva de futuro para os nossos jovens.

Texto
Sérgio de Morais Hanriot
Pró-reitor de Pesquisa e de Pós-graduação da PUC Minas, o professor Sérgio de Morais Hanriot, doutor em Engenharia Mecânica pela UFMG, discorre sobre a importância da pesquisa como ferramenta para o desenvolvimento. “O Brasil ainda não trata a educação como uma política de Estado – e sim de governos – e a consequência é que diante de qualquer crise a redução de investimentos atinge primeiramente o setor, prejudicando a geração de conhecimento, ou seja, a pesquisa”. No entanto, considera o professor, se as universidades vêm buscando alternativas para o desenvolvimento da pesquisa por meio de recursos próprios ou aliando-se à iniciativa privada, não é possível prescindir-se dos investimentos públicos na área.
Foto
Raphael Calixto
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