No mercado de trabalho internacional, a realidade das mulheres brasileiras não é diferente do cenário na sua terra natal. Além da sub-representação e machismo, elas também encontram xenofobia e a necessidade de se adaptar a uma nova cultura. “Se para nós, no Brasil, já é difícil chegar a cargos de chefia, para mulheres em outros países é ainda mais complicado”, é o que diz Lorena Lima Rabelo, autora da tese Trajetória de mulheres expatriadas: preconceitos, discriminação e barreiras do Programa de Pós-Graduação em Administração, orientada pelo Prof. Dr. José Márcio de Castro.
“Queria entender o que leva as empresas a dar mais oportunidades a homens do que a mulheres na expatriação”, afirma. O termo expatriação define uma pessoa enviada para um país diferente do seu de origem para executar tarefas demandadas por uma empresa. Os indivíduos expatriados são escolhidos por sua expertise e desempenho, mas muitas empresas dão preferências a candidatos homens. “Existe um estereótipo de que os homens se adaptam melhor e não têm obrigação com família ou filhos”.
Para a pesquisa, Lorena entrevistou nove mulheres com idades entre 36 e 53 anos e ocupando cargos sêniores. “Algumas relataram que nas entrevistas perguntaram se pretendiam casar ou ter filhos. Ninguém pergunta isso para um homem”.
Luciana Stark é da área de Logística e Suprimentos e recebeu em 2004 a proposta de trabalhar na Guerra do Iraque. O aumento salarial foi uma grande motivação, além do crescimento pessoal e profissional. “Deixei meus filhos no Brasil e foi muito difícil”, conta. Luciana também precisou se adaptar a viver numa base militar. “Eu trabalhava de domingo a domingo, 12h por dia. Só podia sair por via aérea. A empresa ofereceu suporte, mas faltou o preparo emocional do que é ir para uma guerra”, afirma. Luciana ficou no Iraque entre 2004 e 2011 e, apesar das dificuldades, diz que não se arrepende. “Senti que fiz parte de algo importante”. Depois do Iraque, mudou-se para Dubai. “Tive que aprender a viver numa nova cultura”. A sociedade ainda mais machista a surpreendeu. “Não era casada ainda e a empresa teve que escrever uma carta para eu conseguir abrir uma conta bancária”, relata. Atualmente, Luciana mora nos Estados Unidos com o marido e percebeu uma grande diferença salarial após adquirir a cidadania. “Antes eu ganhava 45% a menos que os americanos e americanas na mesma posição que eu”.
Daniela Gonçalves é da área de Recursos Humanos e morou no Chile entre 2015 e 2017 para implantar um sistema de treinamento da empresa em que trabalha. As principais motivações foram vivenciar uma experiência profissional internacional, ser fluente no espanhol e aumento salarial. Ainda que a empresa tenha resolvido as burocracias de documentação e moradia, Daniela aponta que é mentalmente exaustivo deixar a rotina, o país e a família, ainda que temporariamente. “Uma mulher que mora no exterior precisa cuidar muito da saúde mental, espiritual e física. Tem que superar enormes desafios a cada dia e precisa se manter atualizada constantemente. Tem que saber se comunicar com assertividade, tomar decisões, entender que muitas vezes será necessário dizer não para algumas pessoas e/ou situações para dizer sim a si própria”, afirma Daniela. “E não pode faltar autonomia com uma boa dose de coragem para assumir riscos quando sentir que é necessário”.
Ao longo da pesquisa, Lorena concluiu que as empresas precisam criar políticas internas para trabalhar com as questões de gênero e criar soluções para dar mais apoio às mulheres expatriadas. “Já que as empresas consideram que para a mulher é mais difícil por ter filhos, que tal auxiliar na busca por escolas, por exemplo?”, disse. “Precisamos falar mais sobre essas diferenças, mas não é só sobre a expatriação. É também sobre desigualdade salarial e sobre menos mulheres em cargos de gerência. Nós mulheres precisamos entender o que está acontecendo”, aponta Lorena.