Acolhida aos animais silvestres

Projeto, com visitas técnicas a ONGs, aproxima estudantes de suas áreas de estudo
“Quando o aluno participa das visitas técnicas, ele é beneficiado no que se refere ao aspecto técnico, que tem relação com a cirurgia e conhecimento, e também à conscientização e aproximação com aquele animal” Professor Bruno Costa, coordenador do Geas
“Quando o aluno participa das visitas técnicas, ele é beneficiado no que se refere ao aspecto técnico, que tem relação com a cirurgia e conhecimento, e também à conscientização e aproximação com aquele animal” Professor Bruno Costa, coordenador do Geas

Promoção de técnicas, difusão do conhecimento dentro e fora da Universidade e conscientização ambiental. Esses são três dos objetivos do Grupo de Estudos em Animais Selvagens (Geas), do Curso de Medicina Veterinária da PUC Minas Betim. Na ativa desde o ano de 2004, o grupo foi o primeiro a ser implantado no curso do Campus Betim, e vem até hoje promovendo a aliança entre ensino, prática e conscientização socioambiental.

Focado na área de silvestres e selvagens, o grupo é responsável pela realização de diversas palestras que são ofertadas ao longo dos semestres letivos, além da divulgação de conhecimento e curiosidades por meio da página que eles mantêm no Instagram. Entretanto, o grupo busca ir além do conhecimento técnico e científico: com o objetivo de promover o encontro entre teoria e prática, o Geas transcende o conteúdo presente nos livros e salas de aula e aproxima os alunos dos animais durante a realização de visitas técnicas a ONGs e institutos responsáveis pela criação de animais silvestres na região metropolitana de Belo Horizonte.

“Na Universidade nós temos alunos que querem trabalhar com animais silvestres e selvagens, e eles adquirem o conhecimento teórico necessário para isso durante a disciplina focada em silvestres. Já a prática vem por meio das visitas técnicas”, explica o professor Bruno Costa, coordenador do Geas. “Quando o aluno participa das visitas técnicas, nós criamos nele duas coisas: o aspecto técnico, que tem relação com a cirurgia e conhecimento, e também a conscientização e aproximação com aquele animal”, complementa o professor.

E um dos espaços que atende com maestria estes dois benefícios da visita técnica é a ONG Asas e Amigos, que, há anos, mantém uma parceria com o Curso de Medicina Veterinária da PUC Minas Betim.

O médico veterinário Marcos Mourão conta que a ONG Asas e Amigos já abriga cerca de 560 animais, a maioria com alguma deficiência | Foto: Acervo pessoal

Localizada em Juatuba, região metropolitana de Belo Horizonte, a ONG Asas e Amigos é dirigida e mantida pelo médico veterinário Marcos Mourão. O espaço existe oficialmente desde 2001, mas o veterinário conta que, mesmo antes disso, ele, por conta própria, resgatava e tratava de animais que precisassem de sua ajuda.

“Eu nunca consegui virar os olhos para animais necessitados, e busco sempre ajudar. Um ano após eu ter me formado, eu já abrigava cerca de 40 animais na minha casa mesmo. Aos poucos, essa população foi aumentando, e então eu precisei buscar um espaço maior. Hoje, já são cerca de 560 animais na ONG curtindo sua aposentadoria”, diz o médico veterinário, em tom de brincadeira.

Contudo, a situação em que a maioria desses animais chegou à ONG não é nada prazerosa. Advinda principalmente do tráfico de animais silvestres, acidentes em rodovias e abandonos, a maioria das espécies que são entregues à Asas e Amigos, infelizmente, não sobrevive.

“A cada dez animais que eu recebo, sete morrem por conta do estresse e lesões a que foram submetidos, dois ficam com alguma deficiência e eu mantenho vivendo na ONG, procuro dar uma nova chance a eles, e apenas um nós conseguimos devolver à natureza”, relata Marcos.

Entretanto, mesmo sem conseguir salvar todos os animais, a ONG ainda encontra uma forma de ajudar o ecossistema e a pesquisa, por meio da doação de cadáveres das espécies que não resistem e vêm a óbito. Para o médico veterinário, essa é uma outra forma de ajudar aquela espécie, que terá, nas mãos dos pesquisadores, chances futuras de sobrevivência.

“Eu sempre procuro doar esses corpos para a PUC, seja para as aulas de patologia ou para o Museu de Ciências Naturais da Universidade. Já recebi relatos dos professores dizendo o quão entusiasmada a turma fica, dá para ver a vontade deles de aprender. E isso é legal. Não pude salvar a vida desse animal? Infelizmente, não, mas pelo menos pude ajudar de outra forma”, conta o veterinário.

Para o professor Bruno, essa é também uma oportunidade de conscientizar os alunos a respeito do tráfico de animais silvestres, já que boa parte das espécies que chegam à ONG são resultado dos aprisionamentos ilegais.

“Essas doações são muito importantes, porque uma vez que o aluno está em processo de aprendizado, antes de lidar com o animal vivo, é importante ele ter um contato prévio com os cadáveres, porque, deste modo, ele consegue analisar a anatomia do animal e manipulá-lo sem sedativos, permitindo o estudo das doenças. Além disso, quando é proveniente de tráfico, eu sempre procuro mostrar para os alunos as consequências daquela prática, que resultou na morte daquele animal”, ele relata.

Estágio e voluntariado: experiências transformadoras

O aluno Marcos Vinicius, na foto, acompanhado do macaco-prego Chico, residente da Asas e Amigos, diz que quando conseguiu o estágio na ONG soube que este era o trabalho que sempre quis | Foto: Raphael Calixto

Papagaios, araras, tucanos, veados do campo, tamanduás, macacos e felinos. Esses são apenas alguns exemplos das espécies e animais que ganharam uma segunda chance nas mãos do veterinário Marcos e sua equipe de funcionários e estagiários.

O aluno Marcos Vinicius de Oliveira,do sexto período de Medicina Veterinária da PUC Minas Betim, é um deles. Integrante do Geas, ele conta que desde seu primeiro período no curso já procurou a ONG, buscando uma oportunidade de estágio, e acredita que encontrou ali o seu lugar na profissão e na vida.

“Eu sempre gostei muito de animais diferentes, sempre tive coelho, porquinho da índia, etc. Então, na faculdade eu me interessei pela área de silvestres e selvagens, e procurei aprofundar os meus conhecimentos entrando para o Geas. Quando eu consegui esse estágio na ONG eu soube que era isso o que eu sempre quis, por isso estou aqui até hoje”, conta o aluno.

A experiência da aluna Amanda Mendonça, do sétimo período, se assemelha à de Marcos Vinicius. Presidente do Geas, Amanda também teve na ONG a sua primeira oportunidade de estágio, e, desde então, permanece como voluntária na Asas e Amigos e na Clínica Cães e Amigos, clínica veterinária de Belo Horizonte que também está sob a direção de Marcos Mourão. “Na Clínica nós recebemos os animais e podemos acompanhar todas as cirurgias de pequenos ou silvestres com o Dr. Marcos. E na ONG nós acabamos fazendo um pouco de tudo, desde manutenção e checagem dos espaços, até o projeto de enriquecimento ambiental que estamos desenvolvendo atualmente”, ela conta.

Amanda explica que o enriquecimento ambiental visa facilitar a adaptação dos animais naquele espaço, buscando modificar o ambiente para que ele se aproxime ao máximo do habitat natural daquela espécie.

“O mundo silvestre é muito diferente do de pequenos e grandes animais, porque nós precisamos lidar com leis, institutos, ativistas, e precisamos compreender a legislação brasileira sobre isso. Então, as visitas técnicas ajudam muito nessa parte. Começou como um trabalho, e agora acho que para cada um de nós do Geas virou algo pessoal, nós temos um apego muito grande ao que fazemos por lá”, ela relata.

Além de proporcionar o conhecimento técnico e científico sobre as muitas espécies que chegam até a ONG, o espaço também permite que os alunos se aproximem de uma forma especial dos animais, criando vínculos que perpassam a relação médico e paciente. A história de Marcos Vinicius com o macaco Chico é um exemplo de como os animais são capazes de retribuir as ações de cuidado e carinhos recebidas na ONG.

Chico é um macaco-prego que chegou na Asas e Amigos após ser resgatado do tráfico. Ele é parcialmente cego, após ter tido um dos olhos perfurados enquanto estava nas mãos de traficantes de animais silvestres. Marcos Vinicius conta que ele foi sempre muito arisco com as pessoas, e não deixava ninguém se aproximar de seu recinto: ninguém, exceto Marcos.

“Um dia eu entrei no recinto dele, e ele não fez nada. Eu fui me aproximando aos poucos, e com o tempo ele foi confiando em mim. Até que ele deixou que eu me aproximasse tanto que ele subiu no meu ombro e passou a fazer carinho no meu cabelo. A partir desse dia eu percebi que os animais reconhecem o tratamento que nós damos para eles, eles têm consciência de que nós estamos ali para ajudá-los, para fornecer uma melhor qualidade de vida para eles. Desde então, ele virou meu xodó, a minha inspiração”, conta Marcos Vinicius.

Amanda Mendonça é presidente do Geas e teve na Asas e Amigos sua primeira oportunidade de estágio.
| Foto: Raphael Calixto

Atividades também em Poços

Cuidado e dedicação aos animais silvestres também é praticado pelos alunos e professores do Curso de Medicina Veterinária da PUC Minas Poços de Caldas. Em 2021, o Centro Veterinário da PUC Minas Poços de Caldas recebeu em seus cuidados um lobo-guará e um tamanduá-bandeira, que irão permanecer no espaço até que se recuperem completamente dos procedimentos cirúrgicos aos quais foram submetidos. Também no Campus Poços de Caldas, os alunos integrantes do Geas participam ativamente dos atendimentos e intervenções ministradas nas espécies, garantindo ao aluno a experiência completa de aprendizado.

“Tenho desenvolvido junto aos alunos do Geas o atendimento a animais silvestres vítimas de mordeduras, atropelamentos, intoxicação ou outras causas antrópicas. Após os cuidados, eles ficam à disposição para que o Instituto Estadual de Florestas (IEF) encaminhe-os para reabilitação e soltura, instituição zoológica ou mantenedouro de fauna”, explica a professora Erika Fruhvald, do Curso de Medicina Veterinária do Campus, especializada no atendimento de animais silvestres.

Atualmente, a ONG Asas e Amigos possui um programa de apadrinhamento, o que auxilia a manter o lugar funcionando. Para se tornar padrinho ou madrinha de algum animal residente da ONG, acesse o site e conheça as possibilidades de você também fazer parte dessa nova chance que os animais estão recebendo. E não se esqueça de acompanhar também o Geas e a ONG nas redes sociais, por meio dos perfis @geaspucbetim e @asaseamigos

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