Nos últimos anos, a dinâmica política mundial tem mostrado um crescimento preocupante do autoritarismo, com líderes sendo eleitos em contextos de polarização social e desconfiança nas instituições. A ascensão de lideranças autocratas traz reflexões sobre o futuro do constitucionalismo democrático.
A análise de tal fenômeno mescla elementos simbólicos do constitucionalismo com afrontas ao sistema democrático e exige a compreensão de dois conceitos fundamentais: autocracia e democracia.
Os líderes autocratas são definidos, em geral, por sua capacidade de governar sem a submissão a limitações legais ou constitucionais rígidas, subvertendo princípios democráticos. Características comuns incluem a centralização do poder em uma figura ou partido, a repressão de vozes dissidentes e a manipulação de instituições estatais para reforçar o controle. Além disso, esses líderes frequentemente utilizam retórica populista, apresentando-se como salvadores do povo, e promovem a desinformação para deslegitimar a oposição. A ausência de um sistema jurídico independente e a limitação da liberdade de imprensa também são elementos que definem regimes autocráticos, ressaltando a fragilidade da democracia em ambientes onde tais características se manifestam.
As especificidades centrais da democracia incluem a realização de eleições livres e justas, a proteção fundamental dos direitos civis e políticos de todos os cidadãos, a promoção da pluralidade de opiniões e a existência de instituições que garantam a separação de poderes. Este sistema democrático também busca a responsabilização eficaz dos governantes perante a sociedade.
Porém, a efetividade de uma democracia não se baseia apenas nas regras escritas, como constituições e sistemas jurídicos, mas também depende das normas informais que são amplamente reconhecidas e respeitadas pelos atores políticos. É importante destacar que, sem essas regras não escritas, possíveis abusos e manipulações podem levar ao caos político, pois as normas informais ajudam a proteger o espírito democrático e a legitimidade do sistema.
Observa-se, entretanto, que contemporaneamente as democracias não sucumbem apenas por golpes militares ou revoluções violentas. O colapso democrático pode também ocorrer por meio de formas mais sutis de erosão interna, nas quais os próprios líderes políticos, que possuem o poder de desestabilizar a democracia, o fazem não pela força, mas pelo sistema eleitoral. A erosão das normas democráticas é uma estratégia que se desenrola ao longo do tempo — uma série de pequenos passos que, isoladamente, podem parecer insignificantes, mas que, em conjunto, resultam na subversão da democracia.
A ascensão dos líderes autocratas na política contemporânea pode ser atribuída a uma série de fatores que envolvem crises econômicas, a crescente insatisfação popular com as democracias tradicionais e o apelo emocional intenso que esses líderes conseguem exercer sobre suas devotadas bases de apoio. Essa combinação de elementos traz à tona a fragilidade das instituições democráticas e um desejo generalizado por soluções rápidas e eficazes.
Os mecanismos que sustentam a ascensão de líderes autocratas em contextos democráticos são múltiplos. Cita-se, por exemplo, a manipulação eleitoral, contexto em que eleições são organizadas, mas ocorrem sob condições injustas, incluindo o controle da mídia, o fomento da disseminação de fake news, a intimidação de opositores e a utilização de recursos estatais em benefício da campanha do líder. Além disso, a propagação de narrativas populistas e nacionalistas serve para criar uma conexão emocional com o eleitorado, agravando a polarização e descreditando instituições democráticas tradicionais, como partidos e mídias.
Um aspecto fundamental para a sustentação duradoura dos líderes autocratas é o apoio constante e estratégico de elites locais, tais como as grandes empresas de tecnologia, as big techs, que têm buscado ativamente construir relacionamentos próximos com autocratas, oferecendo suporte logístico e financeiro, especialmente em troca de um ambiente regulatório que lhes seja favorável.
Em muitos contextos autocráticos, os líderes associam a identidade nacional a uma ideia de homogeneidade cultural e étnica. Tal ação é alimentada por narrativas que pintam o “outro” — especialmente imigrantes e minorias — como ameaças à cultura, segurança e coesão social do país.
Tais mecanismos não apenas prejudicam a governança, mas também afetam a confiança pública nas instituições, levando a um ciclo vicioso de desconfiança e autoritarismo.
O combate à ascensão do autoritarismo e o fortalecimento da democracia são essenciais, tornando-se necessário implementar medidas de resistência robustas, que incluam a promoção da educação política, esforços de transparência, fortalecimento das instituições democráticas e a participação ativa da sociedade civil na governança. Além disso, instituições democráticas devem ser reforçadas por meio de políticas que garantam a independência do Judiciário, a proteção dos direitos humanos e a promoção de um jornalismo livre e investigativo.
Esses esforços podem criar um ambiente propício para a revitalização e o fortalecimento das democracias contemporâneas, assegurando que a voz popular seja ouvida e respeitada.