O legado de Francisco

A herança de um Papa que escutou o mundo

A eleição de Jorge Mario Bergoglio em 2013, após a histórica renúncia de Bento XVI, marcou um momento de inflexão para a Igreja Católica. Primeiro papa latino-americano, sua escolha representou uma ruptura simbólica — tanto geográfica quanto teológica. Ao adotar o nome Francisco, o pontífice argentino sinalizou um programa voltado aos pobres, à paz e ao cuidado com a criação. Seus primeiros gestos públicos aumentaram as expectativas por mudanças mais profundas em uma das instituições mais antigas e tradicionais do mundo. Mas, não se tratava apenas de gestos simbólicos. Desde o início, deixou claro seu objetivo: promover uma Igreja menos apegada ao legalismo e mais comprometida com a misericórdia, priorizando o discernimento pastoral em vez de uma rigidez normativa.

No plano institucional, conduziu reformas administrativas graduais. Reestruturou dicastérios, reforçou a dimensão missionária da Igreja e ampliou a presença de leigos — homens e mulheres — em cargos do governo eclesial. Sua meta era tornar a Igreja menos burocrática, mais dialogal e descentralizada. Como seus predecessores, Francisco também atuou como agente geopolítico. Manteve uma diplomacia ativa e multilateral, com presença em zonas de conflito. No sensível tema da responsabilização por abusos — uma ferida aberta que desafia a Igreja há décadas —, Francisco deu passos importantes.

Em 2016, instituiu normas para a remoção de bispos que agissem com omissão e tornou obrigatória a denúncia de casos de abuso sexual por parte do clero. Criou mecanismos específicos para investigar autoridades eclesiásticas suspeitas de acobertamento ou má conduta, reforçando um compromisso com a transparência e a justiça institucional. No campo financeiro, outro ponto sensível, Francisco reforçou mecanismos de controle orçamentário e combate à lavagem de dinheiro, além de reformar o estatuto do Banco do Vaticano (IOR).

Apesar de sua eleição representar uma mudança de eixo simbólico, legado significativo e marco histórico, o pontificado de Francisco pode ser interpretado como uma continuidade transformadora, uma recalibragem do centro de gravidade da Igreja. Bergoglio inaugura uma nova fase no papado, marcada pela transição para uma Igreja global, refletindo uma transformação demográfica do catolicismo mundial. Deslocando-se para o sul, atenta-se para a pluralidade cultural e geográfica da Igreja – evidenciando de forma mais clara que a Igreja não apenas se faz presente em todo o mundo, mas se compreende a partir de todo o mundo. Tal perspectiva leva a uma mobilização no imaginário em torno do papado, que pulsa, se desloca e se reinventa durante a história.

Ao focar na escuta ativa, visou dar voz às “periferias existenciais”, dando menos ênfase ao tom normativo da Igreja, levando a uma reinterpretação da universalidade romana como lugar de articulação das diversidades, e não centro de uniformidade. Uma das medidas concretas que apontaram nesse caminho foi a reconfiguração do Colégio dos Cardeais, elevando ao cardinalato número expressivo de religiosos da América do Sul, Ásia e África. Essa estratégia não apenas diversificou sua composição, mas inseriu novas vozes de regiões até então sub-representadas. Francisco também deixou sua marca ao aprofundar o tema da crise climática.

Em 2015 dedicou-se ao tema na encíclica Laudato Si’, propondo uma ecologia integral, reconhecendo a interconexão entre as questões ambientais, sociais e espirituais. Ao integrar a espiritualidade ecológica ao humanismo integral, o Papa deixou importante legado: uma Igreja comprometida com o meio ambiente, reconhecendo a dignidade de todas as criaturas e insistindo na responsabilidade de todos na preservação do planeta. Herança que perdurará como uma das marcas mais significativas de seu pontificado.

Prof. Dr. Rodrigo Coppe

O Professor faz uma breve análise do legado do Papa Francisco ao Catolicismo e à humanidade. No artigo, o professor apresenta como Francisco promoveu mudanças profundas em uma das instituições mais antigas e tradicionais do mundo. Coppe menciona também a atuação do Sumo Pontífice como agente geopolítico.

A Revista PUC Minas não se responsabiliza pelas opiniões expressas pelos autores nos artigos assinados.

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