Construindo pontes

Projeto ensina usuários da Apae a construir maquetes com palito de picolé, desenvolvendo a sociabilidade, autonomia e autoconfiança
O usuário da Apae Brian Luka Silva Loureiro e a sua mãe Fernanda da Silva construíram a ponte juntos | Foto: Raphael Calixto
O usuário da Apae Brian Luka Silva Loureiro e a sua mãe Fernanda da Silva construíram a ponte juntos | Foto: Raphael Calixto

O Curso de Engenharia Civil da PUC Minas da Praça da Liberdade, em parceria com a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Belo Horizonte, está desenvolvendo o projeto de extensão Construindo Pontes, que tem como objetivo a construção de maquetes fidedignas de pontes, usando palitos de picolé como matéria-prima.

O projeto, que reúne 16 usuários do programa de Autogestão e Autodefesa, que integra a Gerência de Defesa de Direitos e Apoio à Família, da Apae, surgiu após o desenvolvimento de algumas práticas extensionistas das disciplinas do Curso de Engenharia Civil no primeiro semestre de 2020. “Por causa da pandemia, de forma remota, vimos a possibilidade de criar esse projeto, colocando em prática uma experiência que já tinha desenvolvido com os alunos”, diz o coordenador da iniciativa, professor Paulo Henrique Maciel Barbosa.

Para construírem essas maquetes, os usuários da Apae BH participam de oficinas de manualidades e receberam, periodicamente, instruções por meio de vídeos postados pelos alunos extensionistas dos Cursos de Engenharia Civil e Arquitetura e Urbanismo da Unidade, por meio do Instagram, WhatsApp e YouTube. De acordo com Elen Azevedo Mariz, gerente de Defesa de Direitos e Apoio à Família, as oficinas foram realizadas por três meses, desde a aquisição do material, ofertado pela Universidade, até a finalização da construção da ponte. “As reuniões para tirar as dúvidas aconteciam aos sábados, a cada 15 dias e, toda semana, os extensionistas mandavam um vídeo para a etapa de construção da ponte, com acompanhamento diário, para ver se estavam dando certo, se eles estavam conseguindo, qual era a grande dificuldade”, comenta a gerente.

Na construção da ponte, além do desenvolvimento da coordenação motora fina dos usuários, outras habilidades também são trabalhadas, como autoconfiança, trabalho em equipe e sociabilidade. Professor Paulo Henrique explica que essas virtudes que foram estabelecidas, em longo prazo, serão características positivas dos usuários. “Como resultado da participação das oficinas, os participantes da Apae desenvolvem a interação social, coletividade e autonomia, características perceptíveis no dia a dia deles”, diz o coordenador do projeto.

De acordo com Elen, um projeto como esse vai muito além de uma questão técnica. “Mais do que a construção da ponte, o projeto reflete uma questão de responsabilidade. O usuário tinha que mostrar as atividades realizadas, gravar vídeos. Ele envolvia a família para apoio na construção. É visível a satisfação de eles saberem que estavam dando conta. É empoderamento”, aponta Elen,

A gerente ainda acrescenta que o projeto de extensão mostra a capacidade de uma pessoa com deficiência em realizar qualquer atividade, desde que seja adequada e acessível. “No capacitismo, pessoas acreditam que um indivíduo com deficiência não vai conseguir fazer algo porque há uma limitação, mas elas são capazes. A deficiência intelectual é uma característica, o que a gente sempre tenta trabalhar é o fato de eles se reconhecerem como uma pessoa com deficiência, porque isso legitima quem eles são. Por exemplo, a ponte dele não ficou igual a de um aluno extensionista, mas ele fez uma ponte, o objetivo foi cumprido”, ressalta Elen. O professor Paulo Henrique concorda: “Não existe limitações para o conhecimento, todos são capazes de conceber e atingir seus objetivos”.

Mãe do usuário da Apae Brian Luka Silva Loureiro, Fernanda da Silva, analista de sistemas, conta que apesar do seu filho ter mais habilidades manuais do que ela, construir a ponte foi uma atividade que os dois fizeram juntos. “Na hora que o Brian viu que tinha palito de picolé e tinta ele ficou animado para utilizar tudo. Foi tudo muito divertido”, relata.

A extensionista Raquel Vasconcelos Fernandes de Oliveira diz que participar do projeto foi uma experiência muito valiosa | Foto: Raphael Calixto

A extensionista Raquel Vasconcelos Fernandes de Oliveira conta que as famílias participaram ativamente do projeto, mas que os alunos foram aconselhados pela equipe da Apae a incentivarem os próprios usuários a fazer todas as atividades. “As famílias se envolviam muito, muitos participantes fizeram todas as suas tarefas auxiliados por elas, mas todos participaram ativamente, o que deu muito orgulho”, relata.

A aluna da PUC Minas ainda comenta que o projeto a fez aprender muito e ser uma pessoa melhor. “É uma experiência muito valiosa para ambos os participantes. Mostrou-me que preciso viver as pequenas coisas, pois foi um tempo em que eu parava tudo e fazia com calma e muito carinho os vídeos para eles, eu me sentia bem. Os dias das reuniões eram dias de sorriso fácil e empolgação, eles me contagiavam com os melhores sentimentos. A engenharia mostra o quão caprichoso e atento aos detalhes do projeto temos que ser na nossa profissão, para no final a construção atingirmos o nosso objetivo”, expõe Raquel.

A interação entre alunos da PUC Minas e os participantes da Apae foi um dos aspectos que mais surpreendeu Elen, pois, dessa forma, a verdadeira inclusão acontece, um acreditando no potencial do outro. “Quando falamos sobre inclusão, é você estar junto, então, eu necessito, enquanto profissional da assistência que trabalha em uma instituição de inclusão, como a Apae, que esses grupos se misturem. Que a Apae e seus usuários saiam dos seus muros e cheguem à Universidade de alguma forma, e se é através de um projeto desse, que se faz essa ligação, perfeito”, destaca a gerente de Defesa de Direitos e Apoio à Família.

Temas Relacionados

Fale Conosco