Vive-se paradoxal fenômeno na contemporaneidade: enquanto a ciência avança velozmente, cresce o número dos que negam, a todo custo, a verdade, refugiando-se em narrativas fantasiosas. “Negacionismo”, eis uma palavra que se tornou frequente no vocabulário cotidiano, sinalizando a expansão dos grupos que se escondem da verdade. Pessoas que buscam reforçar as próprias convicções e valores, fechando-se nas chamadas “bolhas sociais”. Aprisionam-se, assim, em uma realidade aparentemente segura, mas que gera dor, luto e morte, pois distanciar-se da verdade é paralisar-se, tornando-se presa de vicissitudes por falta de coragem para avançar.
Avançar significa também ter coragem para mudar, reconfigurando-se pelas verdades que chegam ao ser humano de diferentes formas, de modo singular pelo caminho das ciências. O conhecimento científico é fruto do percurso traçado por comunidades de estudiosos e pensadores, de modo criterioso, com parâmetros e rigores. Não há razão para temer a ciência. Ao contrário, deve-se, sempre, abrir-se ao novo e buscar contribuir para a promoção de diferentes saberes, levando cada vez mais ética e humanismo às pesquisas que desvelam a realidade. O Papa Francisco lembra: “A verdade deve nos inquietar, voltemos a esta palavra muito cristã: inquietude. Sabemos que existem cristãos que nunca se inquietam. Não há movimento em seus corações, não há inquietude”.
Na perspectiva da fé, a inquietude é o sinal de que o Espírito Santo está trabalhando dentro de nós, ensina o Papa Francisco. Essa inquietude inspira os cientistas na busca pela verdade, sempre questionando a realidade para encontrar novas respostas, contribuindo para mudar o mundo. As descobertas científicas precisam também inquietar cada pessoa, pois a humanidade enfrenta graves e urgentes desafios que exigem a reconfiguração de hábitos, a adoção de novas prioridades.
O aquecimento global é, comprovadamente, agravado pela intervenção humana no planeta, com o consumo desmedido, que acelera a poluição do ar, do solo e o desmatamento. A comunidade científica tem alertado países sobre a necessidade de se buscar nova forma de desenvolvimento, nos parâmetros da sustentabilidade. Isto exige também que cada pessoa repense prioridades, reavalie o seu estilo de vida. Da mesma forma, a pandemia que abala toda a humanidade está sendo enfrentada – com vitórias importantes – graças aos protocolos indicados pela ciência, às vacinas que são fruto do trabalho de muitos pesquisadores. Mas todos esses avanços de nada adiantariam se não houvesse significativa adesão às campanhas de imunização e de adoção dos protocolos para prevenir a disseminação do vírus. A verdade exige reposicionamentos, o abandono da comodidade de sempre permanecer na mesmice, pois inspira novas atitudes. Muitas vezes pode ser difícil encará-la e assumi-la, mas não há outro caminho para os que buscam por autêntica liberdade. “A liberdade tem que nos inquietar, deve continuamente nos fazer perguntas, para que possamos cada vez mais aprofundar sobre quem realmente somos”, diz o Papa Francisco. Neste tempo em que a verdade científica é desconsiderada, apesar de seus muitos avanços e contribuições, deve-se atentar para um desdobramento preocupante: pensadores, pesquisadores e intelectuais têm migrado para países que incentivam o desenvolvimento científico e tecnológico. Torna-se, assim, ainda mais grave, o abismo da desigualdade que separa nações ricas e pobres, com consequências desastrosas para grandes populações. Indivíduos e países que abrem mão do conhecimento, do saber científico, apegando-se a convicções que buscam apenas a perpetuação de privilégios ou comodidades, condenam-se. Renegam a própria liberdade, essencial para se encontrar novo rumo e a verdade.