Mercado mais consciente

Brechós firmam-se como negócios sustentáveis apoiados no modelo de economia circular
Brechós firmam-se como negócios sustentáveis apoiados no modelo de economia circular | Foto: Nathália Farnetti
Brechós firmam-se como negócios sustentáveis apoiados no modelo de economia circular | Foto: Nathália Farnetti

Comprar, trocar e vender peças usadas e seminovas é uma opção que vem ganhando cada vez mais adeptos. Os princípios de produção e comércio baseados na redução e reutilização encontram nos brechós aliados ao consumo consciente. Os brechós são exemplos de negócios sustentáveis, apoiando o modelo da economia circular, já que possibilitam a reutilização de produtos, prolongando seu ciclo de vida e, assim, diminuindo o impacto ambiental.

Estudos estimam que, a cada nova peça que deixa de ser produzida, ocorre uma redução de até 82% da emissão de carbono. A roupa mais sustentável é aquela que já existe e a economia circular é um nicho de mercado em expansão, com projeções que indicam um crescimento nos próximos anos superior ao das lojas de departamento conhecidas como fast fashion, que vendem roupas produzidas em larga escala inspiradas nas tendências do mercado.

Percebendo a urgência de relacionar as pautas de moda e meio ambiente, a aluna do Curso de Administração da Unidade São Gabriel Carolina Mateus de Melo apresentou o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) Consumo consciente e economia circular: análise do modelo de negócios dos brechós de Belo Horizonte. O TCC, orientado pelo professor Sérgio Silveira Martins, avaliou a percepção dos usuários quanto ao consumo de roupas em brechós e identificou aspectos da economia circular no segmento. Simpatizante do universo da moda e cliente de brechó, a discente viu a oportunidade de falar sobre alternativas econômicas e ecológicas de consumo. “Comecei a fazer meu TCC no início da pandemia. Como passava mais tempo nas redes sociais, identifiquei a popularidade que os brechós estavam ganhando. As lives de provadores com as peças, o serviço de entrega e a constante renovação dos produtos me fizeram desenvolver ainda mais contato com essa realidade, além da consciência ecológica mais apurada”, argumentou.

No estudo, a aluna reflete sobre a desassociação da imagem dos brechós de produtos velhos. “O preconceito acompanhou o comércio de itens usados por muitos anos, sendo a origem e a qualidade os principais fatores de desaprovação”, reflete. A mudança de posicionamento adotada pelos brechós e também do comportamento dos consumidores se tornaram fatores de impulsionamento desse mercado. “Eles são de interesse das novas gerações, que possuem entendimento da indústria da moda e têm na reutilização uma forma de expressão”, destaca. O que se viu nas últimas décadas foi uma tendência de consumismo em função da fast fashion, relacionada à fabricação de peças em larga escala. Tendo em vista as mudanças nas motivações de compra do consumidor, os brechós se encaixam no modelo de negócio sustentável e passam a ser uma opção na cultura do reaproveitamento. Nesse contexto, Carolina explora os conceitos slow fashion, pautado pela moda consciente, e fast fashion, relacionado à produção em larga escala, que se tornaram globalmente conhecidos desde a década de 1990. “O fast fashion é um movimento alarmante pois criou uma cadeia de consumo linear muito curta. O efeito colateral da abundância de novidades é o excesso de consumo e a degradação ambiental”, destaca o Prof. Sérgio Martins.

Uma das linhas de abordagem do segmento de brechós é o reconhecimento do guarda-roupa como um ativo inexplorado. Peças sem uso podem alimentar o estoque do segmento. Esta é uma maneira de prolongar a vida útil da roupa e, assim, produzir e extrair menos matéria-prima do meio ambiente.

Segundo relatório da ThredUp, empresa americana com foco em vendas de usados, a movimentação financeira dos brechós nos Estados Unidos pode ultrapassar as lojas do fast fashion nos próximos quatro anos. São previstos 64 bilhões de dólares em 2028 em comparação a 43 bilhões do varejo. Apesar da estatística ser referente aos EUA, chama a atenção pela influência do país e pela potencialização geral do comércio de segunda mão. Para o professor, é preciso refletir sobre outro ponto. “É uma possível contradição porque às vezes quem alimenta o mercado de roupas usadas são as próprias lojas do fast fashion, por meio das grandes lojas do varejo tradicional, já que a maioria dos consumidores compra em lojas de departamento e, depois de usadas, destinam as peças aos brechós”, argumenta.

O professor Sérgio Martins defende a reutilização como alternativa mais viável à produção de peças recicladas. “É comum um produto ambientalmente interessante ser mais caro. Com os brechós, a moda conseguiu achar uma equação que ficou interessante do ponto de vista ambiental, unindo duas questões: o econômico e o sustentável”, comenta.

Maurício Aguiar é um dos sócios do Brechó Peça Rara, no bairro Anchieta. A unidade faz parte das lojas que, em Belo Horizonte e região, registraram crescimento nos últimos anos, segundo levantamento da aluna. “Nossa estratégia de modelo de negócio não é somente comprar e vender objetos usados. É restaurar, reusar e ressignificar o que já temos pronto no mundo. Além de promover a sustentabilidade, oferecemos ao cliente a satisfação do preço mais acessível”, aponta o empresário.
Como parte da profissionalização, os empresários adotam segmentos específicos como atrativo, como lojas direcionadas a marcas de luxo ou peças femininas, por exemplo. Dos brechós em Belo Horizonte e região metropolitana relacionados no TCC, a pesquisa qualitativa desenvolvida por Carolina para o trabalho demonstrou a maior concentração do segmento nas categorias vintage (24), moderno (15) e multimarcas (7). Carolina listou ainda 27 brechós, entre on-line e físicos, com maior notoriedade nas redes sociais, com variações de 3 mil a 70 mil seguidores.

Carolina sinaliza o potencial de expansão dos brechós, sobretudo do ponto de vista ambiental, tendo a política de reutilização como alternativa mais viável para o consumo consciente. Nos métodos de pesquisa qualitativo e quantitativo, utilizados por meio de formulário on-line, a pesquisadora constatou o fator econômico como principal atrativo para os clientes, seguido pelo consumo consciente. Além disso, foi apresentada uma listagem com a evolução do segmento de acordo com o uso do digital e os interesses do consumidor. “Com a profissionalização, creio que a cultura do reaproveitamento tem muito a desenvolver, ressignificar e contribuir para o planeta”, ressalta.

O Prof. Sérgio Martins destaca que a abundância de novidades no mundo da moda tem como efeito colateral o excesso de consumo e a degradação ambiental | Foto: Guilherme Simões
SAIBA MAIS


Fast fashion: Produção rápida e em larga escala. O modelo de negócio é caracterizado por preços mais acessíveis, lançamentos rápidos de coleção e, geralmente, peças com tempo de uso reduzido.

Slow fashion: Ao contrário do fast fashion, tem produção mais lenta e em menor escala. O modelo de negócio preza pela valorização de produtos locais e peças mais duráveis. É relacionado à sustentabilidade e a sistemas de produção mais transparentes.

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