Mulheres e o mundo dos jogos

Programas da PUC Minas contribuem para o empreendedorismo na área, mas mudança de cultura ainda leva tempo
Ana Sílvia Miranda de Barros, formada em Jogos Digitais pela PUC São Gabriel, viu no público feminino um nicho de mercado interessante para criar o Harmony in Love | Foto: Raphael Calixto

Se você acredita que o mundo dos games é majoritariamente masculino, já pode mudar essa ideia. “A maior parte do público que joga e que gasta dinheiro com games mobile é formada por mulheres”, conta Ana Sílvia Miranda de Barros, também conhecida como Ana Naykindo. De acordo com a Pesquisa Game Brasil 2021, as mulheres representam 51,5% dos jogadores no país. Ana, que concluiu sua graduação em Jogos Digitais na PUC Minas São Gabriel no segundo semestre de 2021, está à frente da SeaStudios, juntamente com Leon Matos, que contam com a equipe de desenvolvimento formada por Marcos Vinicius, Sâmia Saul e Lucas Vinny, um estúdio de desenvolvimento de jogos e aplicações gameficadas para aplicativos, eventos, empresas e comunidades, que surgiu com o Harmony in Love, um jogo de nicho para o público adolescente feminino, de fácil acesso e com grande potencial de engajamento.

O projeto do Harmony in Love teve início durante a graduação de Ana e surgiu para atender um público específico: adolescentes do sexo feminino. “Pensamos: se a maior parte dos consumidores para o mobile é formada por esse público, por que não desenvolver algo específico para elas? Existem jogos, mas produzidos no exterior”, explica. Durante o desenvolvimento do jogo, foram aplicadas pesquisas junto ao público de nicho. “Nossa intenção é alimentar o mercado, que é muito escasso aqui no Brasil. Então temos uma fatia grande desse público, mas uma carência de produtos. Sou apaixonada por jogos e me perguntava o motivo de não ter produtos daqui”.

Ana conta que é possível perceber uma mudança de cultura no mundo dos games, uma atuação maior das mulheres nesse espaço – tanto como consumidoras como criadoras –, mas que ainda está longe de ser o ideal. É comum encontrar mulheres na parte de game design e na arte, mas, como um todo, ainda é um mundo bastante masculino. Desde sua criação, 12,77% dos alunos formados pelo Curso de Jogos Digitais da PUC Minas São Gabriel eram mulheres. “O universo de TI ainda é majoritariamente masculino. Mas isso tem mudado. Hoje, por exemplo, nos programas de mestrado e doutorado, temos uma presença feminina bem maior do que há 10 anos. Ainda assim é um público menor. E muitas vezes as mulheres na área de Jogos Digitais preferem atuar em criação e arte, em vez da parte de TI e de programação. Mas no espaço e ocupação do mercado de trabalho, o público masculino ainda é maior. Isso, de certa maneira, influencia nas questões de produção de conteúdo para esse público”, explica o professor Artur Martins Mol, coordenador do Curso de Jogos Digitais da PUC Minas São Gabriel.
Ana também percebe esses movimentos. “Essa mudança é graças às outras mulheres que ocuparam os lugares e abriram as portas para gente. Já temos muitas programadoras no mercado. Tem programas que buscam o público feminino para desenvolver os jogos. E nós, mulheres, nos unimos, sempre nos ajudando a chegar em outros patamares”, explica.

Empreendedorismo na Universidade

O Harmony in Love fez parte do Programa de Pré-Aceleração de Negócios (PAN) da PUC Minas, cujo objetivo é incentivar o empreendedorismo e oferecer suporte a todos os interessados em validar uma ideia, elaborar um plano de negócio ou um produto mínimo viável. “Graças à estrutura cedida pela Universidade, conseguimos desenvolver a versão de demonstração. Contudo, logo após seu lançamento entramos no período de quarentena e precisamos nos reinventar. Utilizamos, para tal, modelos de metodologia ágil aprendidos durante o Curso de Jogos Digitais para que o projeto não ficasse estagnado”, conta Ana. “Participar do PAN e dos eventos e atividades propostos pelo Curso de Jogos Digitais nos preparou para o projeto. Todos os semestres apresentávamos no estilo de pitch”.

Professor Artur Martins Mol, coordenador do curso de Jogos Digitais da PUC Minas São Gabriel, explica que a grade curricular interdisciplinar contribui para a formação empreendedora dos alunos | Foto: Raphael Calixto

De acordo com o professor Artur, a grade curricular é pensada de forma interdisciplinar. “A cada semestre, os alunos têm um tema a ser abordado e uma disciplina que acompanha o desenvolvimento do projeto. Isso simula o mercado de trabalho. Assim, os alunos, além de saírem com um portfólio com vários jogos ou protótipos bem elaborados – que mostram a parte artística, a mecânica do jogo, a narrativa -, também passam pela experiência de produzir o jogo, em uma escala menor. Eles vão evoluindo gradativamente nesses processos de produção dos jogos e ganhando experiência na questão do desenvolvimento, da gestão, das equipes necessárias, do tempo do projeto etc.”, explica o professor Artur. “A formação interdisciplinar facilita quando os alunos entram com um projeto no PUCTec, ou em algum edital do governo, por exemplo, pois conseguem estimar custo, equipe, prazo”.

Por falar em PUCTec, hub de inovação, formação e novos negócios induzidos da PUC Minas junto ao ecossistema de empresas, Ana viu nele uma oportunidade de fazer o Harmony in Love deslanchar. “Participar do PUCTec foi uma experiência muito boa. Se no PAN conseguimos desenvolver a noção de negócios, no PUCTec aprendemos a fazer um produto de verdade, regularizamos nossa empresa. Agora temos CNPJ”. Com as mentorias que receberam, a equipe aprendeu sobre o mercado e sobre monetização, por exemplo. O professor Marcos Arrais, que foi mentor da equipe, acredita que programas como o PAN e o PUCTec são muito importantes, porque trabalham estratégias de trabalho em grupo, equipe, tarefas, planejamento e exercitam um campo transdisciplinar próprio do empreendedorismo. “As equipes têm uma ideia muito clara do que vai ser o produto, como a gente ganha dinheiro com o produto e como será inserido na sociedade. A mentoria ajuda a lapidar o processo antes do produto cair em escala comercial do mercado. O mentor é um suporte paralelo àquele grupo para que possa atingir os objetivos específicos de cada entrega”, explica. “A equipe do Harmony in Love é muito integrada, tem planos bem ambiciosos e o projeto já está bem avançado”, conclui o professor Marcos. “A previsão de lançar nosso game no mercado é no meio do ano”, comemora Ana.